O documentário “Raízes nas Montanhas”, dirigido por Gaia Fuzari e viabilizado pela Lei de Incentivo Paulo Gustavo, estreou com sucesso em São Bento do Sapucaí. A produção, que resgata a história do montanhismo local, provocou discussões sobre a importância do registro, o papel social do esporte e a falta de incentivo para atletas fora do futebol.
O lançamento do filme, que ocorreu no Mountain Festival de 2025, teve uma exibição especial no Centro Cultural Dona Luzia no dia 29 de julho. A diretora, Gaia Fuzari, expressou sua imensa gratidão por ter a oportunidade de “parir esse sonho” através da Lei Paulo Gustavo, uma iniciativa do Governo Federal e do Ministério da Cultura. O cinema estava lotado, refletindo o grande interesse da comunidade.
O documentário é um resgate de uma história importante para São Bento e para o montanhismo brasileiro, com a participação da família do Sr. Antônio Cortez e em memória de dona Isaura Aparecida de Lima Silva, que escreveu um livro sobre a Pedra do Baú. A motivação de Gaia surgiu de uma curiosidade pessoal após sua primeira subida à Pedra do Baú, quando se questionou sobre a origem das escadas e quem havia subido primeiro. A diretora reforça a imensa importância do registro e da contação de histórias que, com o tempo, podem se perder. Ela também ressalta que “no Brasil há muito para que se contar de histórias do nosso povo”, e que muitas pessoas enaltecem culturas e filmes de fora em vez de valorizar as riquezas históricas que temos aqui.
A história da conquista da Pedra do Baú remonta a 12 de agosto de 1940, quando os irmãos Antônio e João Cortez, de São Bento, realizaram a primeira escalada heroica ao cume. Antônio Cortez, fascinado pelas alturas, sonhava em atingir o topo da pedra desde a infância. Após a conquista, para provar a façanha, ele subiu novamente e acenou com um pano branco para uma multidão que o aguardava na base. Anos mais tarde, com a ajuda do empresário Luiz Dumont Villares e de moradores locais, os irmãos construíram as famosas escadas de ferro, que facilitaram o acesso ao cume e tornaram o local um marco para o montanhismo no Brasil.
A obra de Gaia Fuzari vai além do resgate histórico, fazendo uma crítica social sobre a realidade de muitos atletas brasileiros. A diretora cita o exemplo de Celinho, que já representou o Brasil e São Bento em diversas competições, sendo bicampeão brasileiro, campeão mundial e sul-americano em 2014, mas que “ainda precisa trabalhar pesado na roça para viver”. Ela questiona como essa realidade pode ser normalizada, e destaca que o esporte está presente na Constituição Federal, no Artigo 217, que estabelece que o Estado tem o dever de fomentar práticas desportivas formais e não formais, reconhecendo o esporte como um direito de todos. A diretora também argumenta que é preciso descentralizar o investimento no esporte, que no Brasil se concentra em grande parte no futebol, para promover a democratização do acesso e a inclusão social.
O documentário também está sendo exibido nas escolas da região, e o impacto na juventude tem sido notável. Gaia Fuzari conta que viu crianças se emocionando, dizendo que querem escalar, correr e estar nas montanhas, e que algumas sonham em ser escaladoras. Ela reflete sobre o “imenso abismo” que as diferentes realidades de classe social, gênero e raça criam, dificultando o acesso a essas oportunidades. Para ela, “o esporte é um agente de transformação” que forma caráter, fortalece vínculos, promove saúde, dignidade e pertencimento. As oportunidades transformam vidas e, às vezes, são tudo o que uma pessoa precisa. “E isso não é um favor. É um direito”, afirma.
A diretora ainda busca expandir o alcance do filme, e irá levá-lo para os bairros da cidade. A agenda de exibição será divulgada em breve. O documentário “Raízes nas Montanhas” é a semente de um movimento que, segundo Gaia, “continue brotando — em São Bento, nas escolas, nas montanhas, na vida de quem assistir”.